A atitude hostil dispensada pelo presidente Jair Bolsonaro aos veículos de imprensa desde o início da pandemia de coronavírus e o ódio a jornalistas encorajado por parte de seus apoiadores fizeram o Brasil cair duas posições no ranking anual de liberdade de imprensa divulgado pela ONG Repórteres sem Fronteiras.
Agora, o país ocupa a posição 107 da lista de 180 Estados publicada nesta terça (21) pela organização francesa. Essa é a segunda queda consecutiva: no ano passado, o Brasil havia descido três lugares devido ao clima anti-imprensa das eleições presidenciais de 2018 e ao assassinato de quatro jornalistas.
“Os jornalistas brasileiros, e sobretudo as mulheres, estão cada vez mais vulneráveis e são regularmente atacados por grupos promotores de ódio e por apoiadores do presidente, em particular nas redes sociais”, aponta o relatório, sem especificar nomes, acrescentando que repórteres dos meios de comunicação mais importantes do país são alvos frequentes.
Na América Latina, o Brasil está atrás da Costa Rica (7) -a mais bem colocada da região-, do Chile (51) e do Equador (98), mas à frente da Bolívia (144).
À exceção do Uruguai (19), a situação é complicada para os países hispânicos: o relatório aponta dezenas de agressões a jornalistas que participaram da cobertura dos protestos recentes contra os presidentes Lenín Moreno, do Equador, e Sebastián Piñera, do Chile, e reportaram a turbulenta eleição presidencial boliviana de 2019.
Quase não há novidades nos extremos da lista. Noruega (1) e Finlândia (2) ocupam, pelo segundo ano seguido, as primeiras colocações, seguidas pela Dinamarca (3), que subiu dois pontos, e pela Suécia (4), que caiu um.
O pior país para um jornalista é a fechada Coreia do Norte (180), que tomou o lugar do Turcomenistão (179), onde o ditador proibiu o uso da palavra coronavírus.
A pandemia provocou medidas restritivas em relação à imprensa em países fortemente afetados pela Covid-19, aponta o estudo.?
Em antepenúltimo lugar, a China (177) instaurou um massivo sistema de censura, bem como o Irã (173).
No Iraque (162), a agência de notícias Reuters teve sua licença suspensa após publicar uma notícia questionando os números de infectados divulgados pelo governo.
“A crise sanitária é uma oportunidade para governos autoritários implementarem a famosa ‘doutrina do choque’: tirar proveito da neutralização da vida política, do espanto do público e do enfraquecimento da mobilização para impor medidas impossíveis de adotar em tempos normais”, afirma Christophe Deloire, secretário-geral da Repórteres sem Fronteiras.
Apesar de ser considerado pelo estudo um antimodelo no tratamento dado à imprensa, os Estados Unidos (45) subiram três posições em relação à 2019, saindo da faixa “problemática” e ingressando na “satisfatória”.
O relatório não explica os motivos da melhora, ao passo em que enumera razões problemáticas: Trump ataca jornalistas durante suas entrevistas coletivas sobre coronavírus, e repórteres que fazem a cobertura da complicada fronteira do país com o México passaram a ser assediados com muita frequência por autoridades aduaneiras.
Quando vistos em conjunto, os dados do relatório são alarmantes: mais de 60% dos países do mundo estão em situação que a entidade considera “problemática” ou “muito difícil”, e 12,9% caem na pior categoria, chamada de “muito séria”.
Apenas 8% das nações gozam de boa liberdade de imprensa -nenhuma da África- e 18% de satisfatória.
Divulgado anualmente desde 2002 pela ONG Repórteres sem Fronteiras -que promove a liberdade de imprensa e o direito da população à informação-, o ranking se tornou uma referência para a diplomacia e para organizações internacionais como a ONU e o Banco Mundial.? (Bahia Noticias)